sexta-feira, 18 de novembro de 2011

“ Manel” de Alfama



Até ir às sortes, era um rapaz pacato, respeitador e muito metido consigo; lançava mão a qualquer trabalho, era possante e diligente, chegando mesmo a ser um dos jornaleiros preferidos e disputado por quem dava jornas.

Criado aos baldões, sempre foi comendo qualquer coisa e vestindo alguma roupa de lavado graças aos cuidados da tia Lurdes, que se substituiu à mãe, quando esta acabou por morrer na sequência do parto. O pai, madeireiro, ia para onde o serviço assim pedisse e pouca atenção dava ao garoto, mesmo quando estava por casa.

Dizia-se, na vizinhança, que lhe atribuía as culpas, pela morte da mãe, acusando-o de nascer grande de mais. Frequentador e freguês assíduo das tabernas, passava dias que nem via o filho.
Chegada a altura, o Manel lá foi à inspecção e, apurado para todo o serviço militar, apresentou-se no quartel de Abrantes, onde viria a completar a recruta, com elogios dos instrutores e louvor do comandante da Companhia.

Transferido para Portalegre, por lá andou quase dois anos, sem voltar à Terra. Até que um pinheiro desgovernado, caiu para o lado contrário ao desejado e o pai do Manel Eugénio acabou esmagado, quando cortava árvores, no pinhal do Cabeço Pião, já a vistas da Aboboreira.

Passada parte ao Manel, então ainda em Portalegre, veio o rapaz no dia do enterro e, sem falar a ninguém, nem nunca levantar os olhos do chão, voltou do cemitério para casa, metendo-se na cama.

Ninguém mais o viu durante três dias e a Ti'Lurdes, irmã do pai do Manel, só a muito custo conseguiu que engolisse umas malgas de caldo e trincasse uns bocados de pão e queijo.

Chegou ao quartel um dia depois da data devida e acabou castigado com cinco dias de detenção. Além disso nada mais lhe foi apontado na caderneta militar que exibia, com grande satisfação, ao mostrar o louvor que lhe foi feito no final da instrução.

Licenciado ao fim de quase três anos de tropa, passou à disponibilidade, mas não foi para a Terra.

Arranjou amizade com um soldado de Lisboa e acabou convencido que lá é que valia a pena trabalhar e lá é que se podia ganhar e juntar algum dinheiro.

O amigo era natural de Alfama e ia contando ao Manel como eram as pequenas de lá, como o pai chegava a ganhar contos de réis por semana a carregar e descarregar barcos e até se podia aprender um ofício nas obras que naqueles tempos davam trabalho a todos os que quisessem.

Também podia concorrer para a Polícia, Guarda Republicana, Guarda Fiscal, empregar-se na Carris, nos Telefones... Era só escolher.

Mas, para isso tinha de ir para lá e, para os primeiros tempos arranjava-se, lá em casa dos pais, um colchão para dormir e alguém para lhe tratar da roupa.

Cheio de esperança e entusiasmo, o Manel acabou assim por ser devorado por tudo quanto lhe tinha sido dito pelo amigo, antes de abrir os olhos para tudo o que o rodeava e em nada se comparava com a vida calma, pacata e longe da gente ruim que abunda nas grandes cidades e, particularmente, nos meios para onde foi atirado.

O Alberto Costa, conhecido no meio e nas autoridades, por "Bebé", retornou à vida devassa e voltou a ser o meliante que um dia deixara o Bairro para ir cumprir o serviço militar. 

Passavam-se dias que não aparecia e quando o Manel mais precisava dele para o ajudar a procurar trabalho, acomodação e rumo de vida, aparecia a cair de bêbedo, ou quando ia para a cama. Passava as noites nos bares e tinha amigos que não valia sequer a pena conhecer; já no que se referia a amigas, andava sempre com o piorio.

Foi assim, farto das trapaças que tinha visto fazer ao ''Bebé'', que o Manel encontrou um dia, nas imediações do porto de Lisboa, ali por alturas da doca do Beato, uns homens da Carregueira, que se deram por conhecidos e se dispuseram a ouvir o rol de desgraças que o moço da Serra tinha para contar. 

Ouviram-no, compreenderam o caldinho que lhe estavam a arranjar e aconselharam-no a mudar-se o mais rápido possível para bem longe de todo aquele ambiente.

Ficou, logo ali, combinado, que iria viver com o pessoal lá da Terra, para os lados da Pontinha, onde se lhe arranjaria uma cama, lugar para guardar alguma coisa que tivesse, quem lhe cuidasse da roupa e comida. 

Passou a viver numa espécie de comunidade, onde, de facto, se sentia ao pé dos seus e era ajudado quando precisava e, sobretudo, orientado na procura de trabalho.

Não voltou a ver o "amigo" de Alfama e, dizia, com graça e mágoa, que se eram assim os amigos, era melhor conhecer só bichos.

Começou nas obras de um bairro que se andava a construir em Benfica. Trabalhava bem, fazia horas a mais, chegou a servir de guarda da obra e ao fim de meia dúzia de meses já tinha um pé-de-meia razoável.

Soube duma vaga na estiva e começou a ir ao conto e arranjar trabalho na carga e descarga de barcos.

O trabalho pesava, mas os proveitos aumentavam muito e depressa. Chegou a trabalhar dias inteiros, sem ir à cama e a ganhar doze contos numa semana. Para o tempo era muitíssimo dinheiro; um operário, nas obras, ganharia, com algumas horas extraordinárias, à volta de um conto de réis por mês.

Acabou estivador encartado e nunca foi recusado por qualquer chefe de grupo, ou capataz. Vá-se lá saber porquê; era chamado, no meio, pelo Manel de Alfama. 

Ao fim de dois anos de trabalho duro a que o Manel nunca virou a cara, os companheiros das barracas onde vivia, tentaram convencê-lo a ir à Terra por alturas das festas do Verão.

O Manel disse-lhes que nada o ligava já à Serra, praticamente não tinha lá ninguém, uma vez que a tia que lhe servira de mãe, já tinha morrido e os primos nada lhe diziam. Havia para lá uns casebres e uma tapada que deveriam ser dele, pois nunca teve notícia que o pai os tivesse vendido; Todavia, não queria voltar à Terra antes de ser rico e poder mostrar a quem um dia o deu como perdido, que afinal era gente, estava vivo e era, finalmente, um senhor.

Se perguntassem por ele, que arranjassem as desculpas que quisessem e dissessem que quando fosse oportuno ele lá iria, pois não devia nada a ninguém, e ainda não se tinha esquecido do caminho.

Nos dez anos seguintes, até aos trinta e cinco, andou, sabe Deus por onde: desde a pesca do bacalhau, a meses intermitentes na estiva, servente em navios de carga, emigrado em África, criado de gente rica na Argentina e garimpeiro no Brasil, são uma pequena amostra das aventuras que lhe aumentaram largamente a conta nos bancos e os modos e maneiras de se apresentar. 

Aos olhos de quem o viu aparecer lá pelas barracas dos lados da Pontinha onde tinha vivido, parecia aquele senhor que um dia afirmou esperar vir a ser. 

Mas, no fundo, para quem um dia lhe deu a mão, quando andou quase a perder o pé, lá pelas bandas de Alfama, continuou a ser o mesmo Manel da Serra. 

Petiscaram juntos, foram dar uma volta pela cidade, conversaram sobre os projectos e ideias do Manel e, à porta de uma tasca do Campo Pequeno, vendo o Coxo que continuava ali a vender jogo, cumprimentou-o, convidou-o para beber um copo. 

Perguntou-lhe se ainda tinha algum bilhete inteiro. O cauteleiro disse-lhe que nunca trazia bilhetes inteiros, pois raramente tinha fregueses com os duzentos mil réis para comprar um bilhete, mas era só meter-se no eléctrico e ir buscá-lo se ele quisesse. Tem algum número preferido, freguês? 

O Manel atirou-lhe, como quem não faz questão, com um encolher de ombros: a acabar em setecentos e catorze. Foi o número com que joguei nas rifas, lá em Alfama, e com dez tostões ganhei dez mil réis. Se me trouxer um número desses, inteiro, venha aqui à taberna, pois vamos petiscar por aqui e esperar que cheguem mais uns companheiros para batermos uma suecada, ou jogarmos o burro.

Ainda não tinham acabado de almoçar e já o Coxo entrava portas a dentro, com um envelope na mão, dizendo: aqui tem freguês, o número 28.714. Ainda havia o bilhete inteiro; trouxe-lhe as dez cautelas e, como se trata da lotaria de Santo António, são duzentos mil réis. Mas, se tiver aqui a taluda, como vim todo o caminho a pedir ao meu Santo António, ficará três vezes milionário. 

Nesta semana é a lotaria de Santo António. A taluda são três mil contos de réis; é dinheiro a mais para um homem só, mas Deus permita que não morra sem ver satisfeito este sonho que tenho desde garoto: vender um dia a taluda a um freguês, que depois me venha aqui ver e me dê cem ou duzentos mil réis para comprar um fatito e uns sapatitos.

O Manel deu as duas notas ao cauteleiro, agradeceu-lhe o desejo e disse que na próxima semana ia para fora, por dois meses, mas quando voltasse havia de vir ali dar-lhe o prémio, se lhe tivesse vendido a taluda e não seriam os cem ou duzentos mil réis, mas cinco notas.

O Manel tinha segredado ao Elias da Carregueira que quando esteve na Argentina trabalhou para um intermediário na venda de carnes, por atacado. Vendia carne de bovinos, em carcaça ou como animais vivos.

No último barco em que supervisionou o arrebanhamento, contagem e embarque de duzentas toneladas de carcaças e trezentos animais vivos, ganhou trezentos contos de comissões. Era um negócio muito trabalhoso, com muitos intermediários pelo meio, mas, a calcular pelo que via, envolvia muitos dinheiros e grandes lucros.

Queria ver se fazia mais quatro ou cinco negócios e depois pensava vir para Portugal e comprar uma dúzia de andares para rendimento e, quem sabe, arranjar dois ou três sócios de confiança e começar a construir em Lisboa ou nos arredores. 

Era preciso ir pensando num engenheiro, num advogado, num bom guarda-livros e nuns dois encarregados de obras. O capital era com ele e estava disposto a dar sociedade aos cinco sócios, além de interesses sobre os resultados alcançados. Estava a pensar em ficar com 60% e dar 8% a cada um dos sócios.

Mas, Ti'Elias, o senhor é um destes cinco; os outros quatro ainda não faço ideia de quem sejam. Por enquanto não dirá nada disto a ninguém. Rigorosamente a ninguém! Vá pensando, mas não fale, nem com a sua mulher, neste assunto! 

Nessa altura, o Manel tinha em três bancos quase quatro mil contos e diversas acções e outros papéis de empresas no valor de compra de, aproximadamente, dois mil contos. O dinheiro rendia-lhe à volta de quarenta contos por mês e os papéis valorizavam-se outro tanto, pelo menos. 

Tinha três negócios de carnes em curso, entre Brasil, Uruguai, Argentina e a Manutenção Militar, cujos números poderiam, se tudo corresse bem, atingir lucros de dois mil contos. 

Para ultimar contactos com fornecedores partiria, na semana seguinte, para a América do Sul. E levaria consigo um advogado para o orientar nos contratos que iria ter de assinar. 

O doutor Mendes Baeta viria a ser o seu braço direito e parte interessada nos negócios futuros. Também o escritório do advogado, na zona das avenidas novas, seria a primeira morada referida junto dos parceiros de negócios e o primeiro escritório da Sociedade Ulissiponense de Carnes, Lda., cujas quotas eram divididas em duas partes: uma de noventa e cinco por cento, pertencente ao sócio Manuel da Silva Eugénio e outra, de cinco por cento, na posse de António Mendes Baeta. Era gerente da sociedade o sócio maioritário.

Enquanto se estabeleciam os contactos com os fornecedores pelas terras da América do Sul, o Coxo andava que nem um louco a procurar, na taberna do Campo Pequeno, aquele senhor que tinha estado lá com uns pedreiros no fim-de-semana e disse que na semana seguinte iria para o estrangeiro. 

Não revelava o assunto, arranjando algumas desculpas para encontrar o senhor, dizendo que se tinha enganado no troco e lhe tinha ficado com dinheiro a mais, que queria devolver. Deixou recado para que o avisassem, que logo que ali aparecesse, ou algum dos amigos dele, para falarem com o cauteleiro.

Até que, passados dois meses, quando o Manel voltou a Lisboa, foi um dia petiscar ali à taberna do costume e foi abordado pelo Coxo que, chamando-o de parte lhe disse: tenho andado louco para o encontrar. Já foi receber o dinheiro?

O Manel nem percebeu bem o que o homem queria dizer e disse: ainda não comprei, não; arranja-me aí meia dúzia de cautelas! Aí o Coxo, como que segredando-lhe, disse:

Então não se lembra daquele bilhete que lhe fui buscar à Baixa, no eléctrico, quando estava aqui com os seus amigos a jogar as cartas?

Olha, nem sei onde o pus, mas deve estar na Pensão onde moro, ali ao Saldanha. Porquê, homem? 

É que eu nunca quis dizer nada a ninguém mas, finalmente vendi uma vez na vida a taluda; o seu bilhete teve a sorte grande - três mil contos -. Já fui informar-me à Santa Casa e ainda não foi recebido o prémio. 

Como havia de ter sido se o senhor nem estava cá, em Portugal Acho bem que vá procurar as cautelas e vá com elas ao Largo da Trindade, ao serviço de lotarias, levantar o seu dinheiro; é que não sei bem mas há prazos para receber os prémios.

Quanto a mim, já posso morrer; já fiz alguém três vezes milionário. E que Deus lhe dê muita saúde e vida para gozar tão grande fortuna. Peço-lhe só que nunca se esqueça de quem é pobre!

O Manel parou, finalmente, para meditar um pouco, no que acabava de ouvir e, despedindo-se do cauteleiro disse que ia tratar disso, quando tivesse um bocadinho e que continuasse a parar ali pela taberna. 

Ia mandar chamá-lo num dos próximos dias, pois iria precisar muito de falar com ele. Meteu a mão ao bolso e deu-lhe cinquenta escudos para almoçar e beber um copo. E seguiu, avenida abaixo.

Foi à Pensão e lá estavam no envelope da Casa da Sorte as cautelas da lotaria de Santo António, que diziam na parte de trás que os prémios teriam um prazo de seis meses para serem recebidos.

Ainda faltava um mês. Mas, nessa altura pensou: será que o cauteleiro não está enganado? O melhor é telefonar para a Santa Casa a perguntar em que número saiu a taluda da lotaria de Santo António.

Pediu a chamada à recepção da Pensão e quando ouviu dizer o número 28.714 e o valor de três milhões de escudos, desceu à rua, meteu-se num táxi e dirigiu-se à Santa Casa, com as cautelas no bolso e um fervilhar de ideias na cabeça.

Bem, o cauteleiro seria empregado no escritório, talvez paquete, ou porteiro. Teria de saber se tinha casa e família, como viviam e quantos filhos tinha. Encarregaria a empregada do escritório de reunir todos esses dados e trataria depois de ajudá-los. Só poria uma condição: nunca ninguém devia saber nada do segredo que ficaria entre um cauteleiro e um freguês que um dia se encontraram.

Chegou ao seu destino sem dar por isso e, já num gabinete da Misericórdia, vieram dois senhores que observaram as cautelas e lhe perguntaram como queria o pagamento. Podiam passar-lhe imediatamente um cheque visado que ele depositaria, depois, onde desejasse. 

Faria apenas o favor de se identificar e aguardar o tempo suficiente para tratar do cheque, que como compreenderia teria de ser assinado pela Administração.

Mandaram servir-lhe, aperitivos e café e dispuseram um conjunto de jornais e revistas, para se entreter, ou, ir dar uma voltinha e regressar, dentro de uma hora, para receber o cheque. 

Aguardou. Vieram os mesmos dois funcionários e entregando-lhe o cheque, felicitaram-no e disseram-lhe que chegaram a recear o pior, pois já tardava a reclamação do prémio e tinham tido conhecimento que um cauteleiro, que vende lá para o Campo Pequeno, já tinha passado, duas ou três vezes, a saber se o prémio tinha sido levantado. Ao ser informado da não reclamação do prémio, mostrava grande inquietação e retirava-se.

Uma vez disse, desalentado: nunca tinha vendido um bilhete inteiro e nesta primeira vez foi calhar a alguém que nunca mais vi e ainda há-de acabar por perder o dinheiro, ou porque tenha deitado fora o jogo, ou porque se esqueceu, ou sei lá que mais poderá ter acontecido. 

Lembro-me só que ele me disse que eu havia de ter umas notitas de recompensa, mas isso é o que menos me interessa; de pobre não passo, mas a fortuna é do meu cliente e vou procurá-lo até o achar.

Passou no banco e depositou o prémio. Pediu uma entrevista com o gerente e um extracto de conta. Acabou por fazer uma transferência de outro banco da concorrência, para perfazer doze milhões de escudos e conseguiu, atendendo à quantia que ficava a prazo, com um pré-aviso de quinze dias, um juro de 1,5% acima da taxa máxima para os depósitos a prazo.

Feitas as contas teria dali um rendimento de quase cento e cinquenta contos por mês. E, como é evidente, crédito alto, para movimentar os seus negócios, cá em Portugal e no estrangeiro.

A década de cinquenta correra de feição aos negócios das sociedades do Manuel e aqueles três mil contos do prémio da lotaria já nem tiveram o significado que seria de esperar; acabaram por ser mais uma ajuda na subida constante e quase vertiginosa na fortuna do já milionário.

Naqueles tempos o termo aplicava-se a quem tinha, pelo menos, mil contos.

Nos anos sessenta, abriu um escritório na Beira - segunda cidade de Moçambique e o maior porto daquela Província Ultramarina de Portugal. Tinha na cidade um entreposto, com câmaras frigoríficas e relacionava-se com as autoridades militares portuguesas. A maior parte da carne de vaca fornecida à Manutenção Militar, passava pelos seus armazéns. 

Discretamente, à medida que o tempo corria, não era insignificante o apoio que dava aos movimentos de libertação, para onde vendia, igualmente toneladas de carne. E este jogo duplo, trazendo-lhe avultados proveitos, não deixava de ter custos enormes, mas era muito positiva a actividade do Entreposto de Carnes, como denominou a Empresa. 

Movia-se muito bem em Moçambique e foi de lá que partiu para uma parceria com uma empresa dinamarquesa, vindo a tornar-se, anos mais tarde, numa das maiores distribuidoras de carne de ovinos, sobretudo borregos, na Europa e em alguns países de África. Outra parceria alargou esse negócio à Índia.

Nos meados dos anos setenta, o senhor Manuel da Silva Eugénio, de sessenta anos de idade, de nacionalidade portuguesa, solteiro e grande amigo de Moçambique, onde tinha prósperas empresas de negócios, foi condecorado, pelo governo de Maputo, com a Comenda de Mérito Industrial e foi-lhe concedida a nacionalidade moçambicana por serviços meritórios no País.

Do elogio ao agraciado, feito pelo seu sócio e companheiro de negócios, doutor advogado António Mendes Baeta, constava um rol de vinte e três empresas, comerciais, industriais, agrárias e de construção civil e dezenas de significativas ajudas a organizações e serviços de assistência social e humanitária, espalhados por todo o País.

Foi ainda revelado que muito proximamente o Senhor Comendador iria criar uma Fundação, com sede na cidade da Beira e escritórios em Lisboa e Luanda e visando, sobretudo, a educação de crianças órfãs e de famílias sem meios, para além dos filhos dos empregados das empresas do grupo. 

Nessa altura estudavam nos diversos graus de ensino, da escola primária às universidades, a expensas do senhor Comendador, quarenta e quatro filhos de empregados nas suas empresas. 

Os estudos eram custeados até à conclusão dos cursos e, no final, cada um podia candidatar-se aos quadros das empresas, ou ir fazer vida onde bem entendesse. 

Não havia quaisquer obrigações por parte dos beneficiados. 

O capital previsto para a futura Fundação Manuel da Silva Eugénio seria da ordem dos cem mil contos. E, no património da Instituição, figuravam dezenas de edifícios e a totalidade das participações sociais do Comendador nas empresas do grupo.

Por morte do fundador, a fundação era sua herdeira universal.