Nos dias de hoje, grande parte da riqueza do mundo pertence aos sheiks e outros chefes das regiões onde se explora o petróleo, nomeadamente dos árabes.
Daí que poucas dezenas controlem fortunas de biliões de dólares, materializadas em contas bancárias, cadeias de hotéis de luxo, palácios, ilhas artificiais, frotas de carros “topos de gamas” e até exércitos.
E essas fortunas aumentam, em progressão geométrica, a ritmo incontrolado, estendendo-se a poderes, até agora insuspeitos e estruturas inimagináveis, da ciência à política, com ramificações em todo o mundo.
Porém, nem sempre assim foi.
No tempo em que se situa a nossa história, a riqueza dos sheiks era calculada pelo número de camelos das suas cáfilas (manadas de camelos), pelas mulheres que decoravam os palácios e haréns e até pelo número de palmeiras, ou arrobas de tâmaras que colhiam, ou recebiam, dos contributos dos seus súbditos.
Um desses sheiks, de nome Mohammed Saud-Bin, habitava num palácio da Arábia, perto das margens do mar Vermelho. Tinha ao seu serviço uma meia dúzia de sábios: médicos, astrónomos, magos, físicos e matemáticos, entre outros menos cultos, como operários de construção e pessoal de defesa. Acima de todos estes estavam os encarregados das rezas e dos ritos diários e serviços das mesquitas.
No polo oposto - os de mais baixa condição - estavam os guardas, entre os quais os eunucos, que guardavam as concubinas dos haréns. A guarda pessoal do sheik chegava a ser um autêntico exército.
Ao sentir-se envelhecer, o sheik foi tomando as suas precauções e mandou que os cientistas que sempre o acompanhavam e serviam, começassem a registar as suas vontades, relativas às suas diversas comunidades, para que, por sua morte, não restassem quaisquer dúvidas.
Naquele palácio e região dependente, o sheik tinha três filhos homens e sete filhas mulheres.
Como era hábito e segundo os preceitos religiosos, a maior parte dos seus bens seriam para o filho herdeiro – o mais velho -, ficando duas partes menores para os mais novos homens. As filhas seriam entregues à guarda do filho mais velho.
A cáfila do palácio tinha dezassete camelos que, segundo a vontade do sheik seriam distribuídos pelos três irmãos, na proporção seguinte: metade para o mais velho, um terço para o do meio e um nono para o mais novo.
Não poderiam ser comprados ou vendidos camelos, pois pela crença do sheik no palácio teria que haver sempre aquele número de camelos – 17 -.
Ao tomar conhecimento das vontades do sheik, o matemático começou a resolver a partilha para que na altura própria tudo estivesse preparado.
A maior parte dos bens não levantava quaisquer problemas, mas quando chegou à cáfila é que se pôs um problema insuperável: como havia de se dar metade de dezassete camelos? E um terço? E um nono? E com a vontade do sheik que impedia a compra ou venda de camelos e exigia que a partilha fosse rigorosa não prejudicando nem beneficiando ninguém.
Passado algum tempo o sheik foi chamando, um por um, todos os seus cientistas, para se inteirar da forma como pensavam dividir os seus bens quando um dia faltasse.
Todos iam enumerando as decisões e o sheik ia aprovando, até que ao chegar ao matemático não obteve qualquer resposta positiva: ainda não tinha encontrado maneira de dividir a cáfila segundo a vontade do senhor.
Pois dou-te mais dezassete dias para resolver o problema. Depois serás demitido e castigado. Caso não tragas a resposta, será feita a pergunta em todo o território e quem trouxer a resposta tomará o teu lugar e os teus bens.
O tempo foi passando e ao fim dos dezassete dias dados pelo sheik, o sábio matemático reconheceu a sua incapacidade de fazer a divisão dos camelos da cáfila.
Foi imediatamente suspenso das suas funções e, por ordem do sheik, foram publicados avisos, em todo o território, sobre a forma a aplicar para distribuir os camelos pelos três filhos do sheik:
- “No prazo máximo de dezassete dias, qualquer cidadão poderá apresentar uma resolução para dividir os 17 camelos da cáfila pelos três filhos, dando metade ao mais velho, um terço ao do meio e um nono ao mais novo. O prémio pela resolução do problema será muito generoso.”
Não faltaram respostas com partidas de camelos ao meio, com compras de camelos ou vendas, etc.. Mas ninguém tinha apresentado uma solução, até que ao 17º dia, um cameleiro se apresentou na entrada do palácio, para apresentar a resolução do problema, respeitando todas as vontades do sheik.
Levado à presença do sábio de matemática e outros colegas, o cameleiro pediu que o levassem junta da cáfila.
Ali chegado, mandou prender o seu camelo, no fim dos 17 do sheik, após o que começou a fazer a divisão, sempre com a confirmação do sábio:
Metade para o filho mais velho: 18:2=9 e pediu a confirmação ao sábio, que acenou afirmativamente com a cabeça.
Um terço para o do meio: 18:3=6.
E, por fim, um nono para o mais novo: 18:9=2.
Ora somando as três partes: 9+6+2=17. Podem mostrar a todos os presentes os três grupos, para que verifiquem que está certo e considero o problema resolvido.
Mas não podem sobrar nem faltar camelos e ficou um preso, depois de retiradas as partes para os três filhos do nosso sheik, disse um dos presentes.
Foi a vez do cameleiro, calmamente, se dirigir ao seu camelo e dizer-lhe: este é meu e cumpriu bem o seu trabalho, por hoje.
Chamado à presença do sheik, o cameleiro explicou como resolveu o problema e que o seu saber lhe vinha da vida já longa, ao serviço do Seu Senhor, que sempre serviu com lealdade.
Perguntando-lhe o que esperava como recompensa, o cameleiro respondeu: ir dar de comer ao meu camelo que me ajudou a prestar um serviço ao meu senhor e descansar, pois a idade já não me permite grandes emoções.
Decretou o sheik:
O cameleiro Habib Munir passa a ter morada no palácio e será elevado à dignidade de Conselheiro do Califado, fazendo parte da minha guarda pessoal. A sua família trabalhará em terras perto do palácio que lhe serão imediatamente entregues e serão retiradas ao sábio matemático, que será poupado apesar da incompetência manifestada, deixando de fazer parte do Conselho Especial do Sheik.
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