terça-feira, 21 de julho de 2009

O mestre-escola

Nos meados do século passado, a figura de Professor Primário, como a de Padre e as autoridades da terra e do concelho, estavam acima dos outros mortais.

Havia respeito total, absoluto e incondicional e quando os pais iam levar os filhos, pela primeira vez, à escola, recomendavam e pediam: Senhor Professor ou, o mais vulgar, Senhora Professora, chegue-lhe, se precisar! Nunca lhe doam as mãos, pois só se perdem as que caem no chão! Faça dele um homem – ou uma mulher – que nós saberemos agradecer-lhe!

Em casa da Professora não faltava nada; era um corrupio a levar os mimos e as primícias das colheitas, passando pelos queijos, ovos e consumos do dia a dia, até ao pão, acabado de cozer.

Uma vez por mês, ia à vila, receber os seiscentos mil réis de ordenado de Regente do Posto Escolar, ou o conto e duzentos, de Professor e aproveitava para dar um jeito no cabelo, visitar uma ou outra loja de roupas e sapatos e nunca regressava à aldeia sem passar pela farmácia, onde deixava uma parte dos seus parcos proventos, em troca dos comprimidos para as dores de cabeça, flatulência, vesícula, dores reumáticas.

Para uso próprio e para dispensar aos aflitos, na aldeia.

Visitava, normalmente, o Senhor Delegado Escolar e o Senhor Vigário, com quem combinava a participação nas cerimónias religiosas e de quem recebia orientação e documentação para promover as vocações, organizar os peditórios para a Paróquia, os Seminários e as Missões. Organizava-se, também, a Cruzada e a Catequese.

Nas aldeias, a Professora passava o dia na escola; ia a casa, para tomar as refeições, ensinar a coser e bordar as raparigas casadoiras e ler uns livritos da Biblioteca.

As aulas, na Escola, ou Posto Escolar, com duas ou três dezenas de alunos, das quatro classes – iam das nove às dezoito horas – decorriam na mais rígida ordem e disciplina e, por vezes, os mais adiantados ensinavam os mais novos a fazer contas, estudar a tabuada, ou ler no livro de leituras.

No fim de cada ano, os alunos dos Postos Escolares, iam prestar provas de passagem de classe à escola mais próxima, ou fazer exame da quarta classe à sede do concelho, onde, não raras vezes, eram aprovados com distinção.

É da mais elementar justiça reconhecer o trabalho destas senhoras – havia muito poucos Regentes Escolares do sexo masculino – que ensinaram até onde tinham aprendido e desenvolveram em muitas crianças, por essas aldeias fora, hábitos de trabalho e estudo, a par de uma formação moral baseada em sólidos princípios de cidadania e amor pelo próximo, que serviram de orientação a muito boa gente.

É de lamentar que a reorganização social, que tantos benefícios trouxe, tenha enjeitado muitas dessas bases, sem acautelar o culto do civismo, do amor e respeito pelo semelhante, do valor da pessoa, no seu todo, e das instituições que a servem.

Por mim, não quero esquecer as primeiras Regentes Escolares, que tive por professoras; elas ensinaram-me muitas coisas que me tenho recusado a abandonar e continuo a seguir, como capítulos do mais belo tratado que um homem pode escrever – a vida –.

Foram elas, que me motivaram a ser Professor.

Embora tenha, mais tarde, abandonado a profissão, sempre me orgulhei de dar um carácter didáctico ao meu trabalho e nunca me esquivei a ensinar aos outros, até onde pude e soube!...

Tenho sempre presentes os meus alunos, os muitos amigos... e todos quantos se iniciaram comigo, nas artes das Vendas e das Técnicas de Marketing, em que tenho desenvolvido a minha actividade profissional.